Por que mexem com tiriri?

Eu sigo me perguntando se existe algum ponto que separa a audácia da estupidez, pois basta olhar ao redor para perceber que as pessoas testam limites que jamais deveriam testar e insistem em avançar sobre aquilo que já está muito claro dentro das nossas práticas. Os pontos cantados não são apenas louvação, são advertência, são doutrina e são a revelação do caráter de um Exu. Quando ouvimos um ponto, ouvimos também um aviso.

Basta observar alguns trechos de pontos de Exu Tiriri que falam por si.

“Não mexa com Tiriri,
Que ele não é brincadeira,
Ele entra no seu sonho
e faz você virar caveira. “

“Quem nunca teve um pesadelo
ô essa noite vai sonhar com Tiriri. “

“Eu tava quieto
no meu canto sossegado
Você mexeu comigo
mexeu foi com o diabo“

“Se ele é Exu
Não tem medo de ninguém
Na Encruza ele é um gato
Na Virada ele é um trem. “

“Tiriri é o diabo
ele é o satanás
Na calunga ou na encruza
é ele quem pode mais“

Quando lemos isso de forma sincera e sem o verniz que muitos querem dar ao mistério, a pergunta se impõe. Como alguém ainda acredita que pode confrontar Exu Tiriri. Como pode haver tamanha ingenuidade, tamanha soberba, tamanha falta de noção da própria pequenez diante de uma força que é movimento rápido, olhar distante, domínio dos oráculos e leitura profunda dos destinos. Tiriri é o signo mercurial em sua forma mais viva, é sagacidade, antecipação e velocidade. É quem corre antes do pensamento e chega antes do perigo.

Mexer com Exu Tiriri é pedir para que nada funcione, é pedir para perder o que se tem e o que não sabia que possuía, é provocar o fechamento de caminhos e descer ladeira abaixo sem perceber que foi empurrado. Tentar violar espaços que pertencem a ele, tentar forçar sua presença ou seus segredos sem sua permissão é abrir a porta para ser demandado até a última gota, é realmente se tornar caveira. Os pontos não falam apenas por metáfora, falam por fundamento. Quem conhece Tiriri em terra com seu riso fácil não imagina a profundidade do outro lado. Mas basta encarar seus olhos negros para ver o abismo, ver a própria Kalunga olhando de volta.

O ponto já avisa. Ele entra no sonho e faz virar caveira. O sonho é sua estrada. O onirismo é sua porta de entrada. Ele trabalha pelo pensamento, pela noite, pela imagem que se forma quando o corpo adormece e a consciência se solta. Há incontáveis relatos de pessoas que sonharam com Tiriri e acordaram diferentes, marcadas, movidas, mexidas. O sonho é o lugar onde ele desvenda medos, sombras, segredos e terrores escondidos.

Outro ponto afirma que ele estava quieto, mas mexeram com ele. Isso já diz tudo. Ele não procura conflito à toa. Ele sabe observar, sabe aguardar, sabe distinguir o que merece seu movimento. Mas se necessário, ele mostra exatamente o que é. É diabo, é chama, é o ponto que rasga o véu. Seja na encruza ou na Calunga, está onde seu poder é absoluto.

E quando se diz que na encruza ele é um gato, isso não é um elogio trivial, é descrição fiel. O gato é o predador perfeito, silencioso, calculado e veloz. É pequeno mas domina o território. É dócil na aparência e letal na essência. Caça presas maiores que ele e se reproduz como presa, embora seja caçador. É expansão e controle, é adaptação e triunfo. Assim é Tiriri quando pisa nas encruzilhadas. Ele vê antes, age antes, vence antes.

Por isso o aviso não é conselho, é mandamento. Seu Tiriri é Rei e já recebeu coroa. Não lute contra isso. Não provoque o que você não pode sustentar. Não desperte aquilo que não sabe acalmar. Quem mexe com Tiriri já perdeu antes de começar.